sábado, 18 de janeiro de 2014


Escritos
Meu ato de escrever é criminoso
Deliberadamente pulsional.
Um crime de matar
Mato para escrever
Escrevo para dar vida.
Meu ato de ir para voltar.
Algo vive nas reminiscências
Encontro-me sempre despido
Uma nudez que cobre meu ser.
O meu sangue é a palavra
Com cor de texto.
Palavra que não possuo
Que invade para pode sair.
que sai para ficar por alguns instantes
Minha melhor roupa é a escrita.

Bom dia
Desconheço a tua ira
Não pude ainda conhecê-la
Nem cortejá-la.
Tão cedo cultuo o pesar.
Esta maneira de falar das coisas
O grito, o gesto.
A forma como andas
para não chegar a lugar algum.
Pisas o chão com força
Quero te falar
Disso que não sei.
As imagens dizem sem língua
Um bom dia
Uma felicitação, uma concórdia
Um salve-rainha.
Rito de alegria e sol.
Bom dia.

sábado, 25 de junho de 2011

Iventurias


Tenho desejo de produzir tolhas da ilha da madeira
Com pontos mil, cruzados, transados em zigue e zague
Toalhas de senhoras de fazenda como aquelas de minha vó lá em Santo Antonio da Mata
Caras como as quitandas feitas ao fogão de lenha, como os ventos e ricas como o anoitecer
Toalhas advindas do oriente e traçadas no ocidente
Quero ir a essas veredas, ir sem fim, até o por fim onde o sol debruça-se após o dia.
Ir para falar minhas faltas e gritar meus desencantos
Chorar minhas canseiras e minhas implicações
Em tempos pontiagudos é preciso semear mansidão
Compor cantigas de rebeldia com docilidades angélicas
Brincar de palavra cruzadas e pular amarelinhas
Compor uma aquarela de verbos
Jurar amores a uma donzela, bailar austero e confiante frente às maldades.
Mas, há uma coisa a não permitir, algo a resistir:
Não deixar-se matar e não morrer sofrendo, não virar objeto e não desacreditar o sujeito
Coisa delicada, inventiva e lúcida a se fazer
Calma e perene a constituir-se ao longo das falas
Que coisa é essa?
Que caminha nas entrelinhas dos discursos, no ir e vir das palavras
Entre o dito e o resto a dizer.
Significado é dicionário comum à vida
Significante é inventuria para existir 
Inventuria é palavra forjada para exprimir evento e aventura
Façamos assim: inventuria produzidas como contos
Contos de divã     
Desconexos modos de falar sobre os meios como existimos. 

sábado, 18 de junho de 2011

Luta pela Liberdad


A liberdade é aquilo que não podemos abrir mão ao mesmo tempo, é algo de difícil definição. Nada sabemos sobre a liberdade se não a reconhecermos como aquilo que nos enlaça ao social, às relações como o outro nos inscrevendo como sujeitos políticos. A liberdade sempre nos chamou a atenção ganhando horizontes éticos e filosóficos e conquistando nossas mais apaixonadas inspirações de luta por um mundo melhor.
Todavia definir a liberdade é uma tarefa difícil para qualquer um, pois todo exercício nessa direção, inevitavelmente estabelece um confronto. A liberdade de um pode ser perfeitamente a opressão de outro. O simples fato de estarmos condenados à liberdade como aponta o esplêndido Sartre revela que esse ideário constitui-se em uma fundamental condição existencial.
A liberdade é algo relativo aos modos como existimos nesse vasto mundo com suas incomensuráveis incongruências, injustiças e maledicências. Nossa condição humana nos remete a pensar sobre a liberdade e a criar parâmetros jurídicos para regular suas expressões em nosso tecido social. Ao longo de nossa história temos inúmeros monumentos para materializar aquilo que não possui uma única forma.
Orgulhamos-nos desses edifícios que se erguem em nossa cidade, em nossos países para confirmar, nada mais que isso, a importância da liberdade como algo ontológico ao humano. Sendo assim, esse dado ontológico é igualmente relacionado ao fato de que ao sermos diferentes, a liberdade é algo relativo ao desejo, à vontade, ao engajamento, à luta contra a opressão.
Como aponta Bauman, nosso devir na contemporaneidade, remete-se irrevogavelmente à luta contra a opressão e não há dúvida que estamos qualificados a nomeá-la. Somos nós os operários mal remunerados, somos nós que recebemos salários rigorosamente baixos, somos nós que nos encontramos desempregados, com acessos limitados ao lazer, à educação, à saúde, somos nós que nos encontramos mais vulneráveis em todos os aspectos. Curiosamente, somos nós que pagamos altos impostos no Brasil.
Portanto, todo movimento de luta pela liberdade deve ser bem vindo e quando o Estado e a sociedade agem contra essas manifestações de forma truculenta e violenta, respondem adequadamente à peculiar aspiração de manter as opressões como mecanismo eficaz de sustentar a ordem disciplinar de nossas sociedades. Como aponta Foucault, nossas sociedades são necessariamente disciplinares e produziram instrumentais diversificados de contenção, ordenação, massificação, dominação, alienação e formatação de nossos pensamentos, comportamento, ações, corpos, sonhos e projetos.
Ordenamento provocativo e sutil que enlaçado à lógica liberal e consumista desenvolve uma atmosfera alienante que nos remete a uma vida liquida moderna como aponta Bauman, ocorrência que fortifica os quadros de miserabilidade e opressão. Ao observarmos o mundo contemporâneo em suas múltiplas manifestações caóticas podemos colocar à cena de nossas demandas sociais questões ecológicas, de gênero, sexuais, operarias, agrícolas, entre outras.
Todas essas questões nos conduzem a nos agrupar em grupos específicos que compartilham suas particularidades e, em grupos organizados, materializam movimentos de enfrentamento à peculiar opressão que recai sobre sua condição existencial e política. Os Movimentos Feministas agrupam um conjunto de mulheres que, sabedoras de sua peculiar opressão, numa sociedade falocêntrica e machista, se agrupam para lutar contra a subjugação.
A grosso modo, esse é o mecanismo que consagramos para a produção dos movimentos sociais e a partir de uma amplo processo discursivo e de convencimento, agregamos às fileiras de luta outras pessoas e assim, damos relevância à demanda que se coloca ao exame das coletividades. Esse processo passa invariavelmente pela “produção de uma consciência critica” endereçada politicamente a mudar uma dada realidade.
Entretanto, essa forma de organização é semelhante, mantendo as devidas especificidades, ao modo como tornamos cientifica e metódica a produção do trabalho a partir das concepções liberais e capitalistas de Ford. Esse modelo cientifico de pensar e realizar o trabalho, transformou nossas sociedades, impulsionou o capitalismo, redefiniu o lugar do operário, fortaleceu a burguesia e contribuiu para a lógica consumida; portando, essa elaboração contemporânea é um modelo fundamental que informa como podemos viver e compartilhar as coisas no mundo em que nos encontramos.
Remeto-me à organização cientifica do trabalho porque se concebemos a liberdade como algo ontológico à nossa condição humana, nossa capacidade de trabalho é inerente à constatação de que somos os nomeadores do mundo, e a liberdade é uma enunciação fundamental para vivermos, para nos pensarmos, para compreendermos o mundo e nosso lugar no mundo. Sua materialidade se confunde com nossa própria materialidade que se constitui no mundo junto aos outros.
Nesse sentido, devemos nos deslocar do modelo hegemônico de organização dos movimentos sociais. Penso que devemos reinventar os processos de emancipação como propõe Boaventura. A questão da emancipação torna-se um artefato de luta e sua definição é emblemática. Buscar a emancipação pressupõe lutar contra as opressões. Mas, não podemos realizar essa luta com as armas já colocadas pelo sistema.
Sendo assim, penso que é oportuno produzir anti-movimentos e, para tanto, seguir as pegadas e os exemplos de Steve Bico e Nelson Mandela. Nessa direção, me reservo a liberdade de fazer uma crítica à luta pela liberdade que tanto me interessa. Essa luta só será bem sucedida se, para além dos slogan das passeatas, pararmos para aprofundar essas enunciações e produzirmos mais que ativismo, conhecimentos e tecnologias libertadoras.
Entretanto, temos que colocar com mais firmeza a questão racial brasileira com o mesmo teor de importância das demais. Alias, historicamente, o Movimento Negro a exemplo do Movimento Feminista são as fontes das primeiras manifestações que invadiram nossas ruas e mentalidades reivindicadoras. Os afro-descendentes no Brasil são rigorosamente os mais vulneráveis.                                                                   

segunda-feira, 2 de maio de 2011

O Assassinato de um Assassino: notas sobre a intensificação do terrorismo no mundo contemporâneo

Estamos a comemorar o assassinato de um assassino produzido por nossa temporalidade. Forjado pela barbárie de nosso tempo que articula um novo modelo de Cruzada, que separa de forma radical, o ocidente e o oriente. Esse “novo” modelo, cultuado há séculos, captura nossas representações acerca do bem, do mal, do cristianismo, da terra santa, da verdade, da justiça e da liberdade.
Entretanto, a morte de um homem não deve representar apenas uma ocorrência singular à nossa condição existencial. Os homens não devem ser destinados à morte de forma a negar ou mesmo banalizar nossa dimensão transcendental. Os homens são animais específicos e não somos feras, por isso mesmo, em tempo algum sepultamos apenas cadáveres.
Basta uma visita rápida aos lugares onde enterramos nossos entes queridos para sabermos que, de certa forma, todos sem distinção permanecem vivos em nossa memória. Aliás, reconhecer isso é perceber que nunca estamos absolutamente sozinhos no mundo. Somos um bicho relacional, simbólico e discursivo. Nenhum tipo de pragmatismo disciplinar contempla a utopia do controle sobre a vida e suas intercorrencias.
Comemorar o assassinato de um assassino, parafraseando Boaventura, não permite a produção de uma vida mais decente e não edifica nenhum conhecimento prudente. Penso que estamos cegos, cegos que vendo não vêem como diria o saudoso Saramago. Em outros termos, como diria um velho homem de meus tempos de meninice: “quem planta vento, colhe tempestade”.
O aclamado terrorismo tem se configurado como nossa melhor expressão maquiavélica sustentando a proposição de que o “homem é o lobo do homem”. Nessa lógica, nos endereçamos a aniquilar nossos inimigos e todos são inimigos, na medida em que, não compartilham nossas considerações. Talvez essa seja uma consideração simplista do exemplar e atual o Príncipe de Maquiavel. Todavia, essa leitura pode ser percebida frente ao espetáculo dantesco que estamos a presenciar.
Vivemos num mundo espetacular, até os inúmeros assassinatos diários de cada dia, que invadem nossas casas se tornam comerciais. Assim, até a desgraça se constitui em um objeto para ser consumido, para saciar nossa fome incomensurável. Estamos aprisionados numa temporalidade “Hollywood”, mais especificamente onde nos colocamos a “exterminar o futuro” produzindo uma narrativa apocalíptica como que deseja apenas a morte.
Há de se interrogar isso. Como sustenta Alain Badiou o ocidente tem muita consciência sobre o mal, mas, negligencia pensar acerca do bem e, a partir dessa incongruência estratégica, convencionamos falar sobre “ética”. Pensar sobre o bem é algo deveras muito comprometedor à lógica massificante que nos consome. Por isso, nos colocamos assim, a comemorar o assassinato de um assassino, a construir muros, armas de destruição em massa, tiranias, especulação econômica, a caixa de pandora está rigorosamente aberta para todos e em todo os lugares.
Se olharmos para os “lideres mundiais” ouviremos cada discurso, práticas, políticas que nem poderíamos imaginar. Ora, eles dizem o que estamos a pensar e seria prudente e elucidador reconhecer que participamos dessas produções. O Presidente dos EUA é o herdeiro do discurso crítico e emancipador de Martin Luther King, enunciação de um sonho que perpassa a presença de nossos ancestrais africanos barbarizados, mas nunca, absolutamente derrotados pela violência da escravidão da qual ainda somos tributários e que perpassa nossa condição existencial, humana e política em todo o mundo.
Mas, ouvi-lo supor que o assassinato de um assassino é um ato legítimo de justiça é algo inaceitável. Considerar que a justiça se confunde com a vingança é, verdadeiramente, potencializar o terrorismo. Talvez essa seja nossa principal identidade nos dias atuais alinhada, articulada e alinhavada com o nosso principal papel público e intelectual: consumir, trabalhar, servir, dormir e voltar a consumir para manter a lógica de nosso tempo.
Michel Foucault indaga a produção da justiça em meio à edificação do Estado Liberal de Direito, ele esclarece que antes da Idade Moderna, a justiça era praticada em nome de um Rei Absolutista que detinha a soberania do Estado e o poder de vida e morte sobre os vassalos. Ocorre que não somos mais vassalos, mas, ainda assim, todas as produções civilizatórias do Estado Liberal estão sendo dramaticamente sepultadas. Esse me parece o pior efeito dessa ocorrência que alguns freneticamente comemoram sobre o pseudônimo de enfrentamento ao terrorismo.
Enfrentar o terrorismo é algo absolutamente necessário. Não podemos recuar desse desafio. Não podemos aceitar as mortes que essas ações produzem, nem os discursos que engendram e nem suas banais justificativas. Devemos recuperar as considerações de Hannah Arendt sobre o flagelo do holocausto que atravessa nossa condição humana. Observação impertinente: todos nós somos humanos apesar de nossas diferenças e ninguém, em lugar algum, é mais humano que outro Homem.
Se desejamos superar o terrorismo devemos fazer arqueologias e cartografias que escapem aos ditames hegemônicos, para encontramos os exemplos de justiça que conservam um potencial retificador, poético, político e humanizador para a conservação da vida, para pensar o bem, para sermos mais prudentes e pacíficos. Nesse sentido, distribuir nossas riquezas com mais equidade é algo fundamental.
Quando penso em arqueologias e cartografias é porque considero que as respostas são parciais, mas estão em todos os lugares e culturas, são produzidas por nós e vivem conosco em nossos desafios e em nossas possibilidades.
Quero apresentar alguns exemplos:
Historicamente, influenciamos aqueles que nos escravizaram e, como aponta Paul Gilroy (2002), nunca fomos apenas músculos porque trouxemos conosco nossas culturas e religiosidades. Nesse sentido, podemos conceber que a elaboração do candomblé constitui-se como um processo político e social, empreendido pelas diversas etnias africanas no ambiente coercitivo das senzalas.
Portando, esse processo ultrapassa os horizontes próprios aos saberes ancestrais e religiosos. Essa elaboração é eminentemente afro-brasileira, ou seja, ela é africana em sua matriz e tornar-se brasileira em sua continuidade histórica. Portanto, a elaboração do candomblé a partir das religiões africanas, constitui-se em uma estratégia elaborada para desenvolver meios de transformar a realidade imposta pela escravidão. Sendo religião o candomblé também é um aparato de luta e resistência.   
A matriz africana, a que nos referimos é a materialidade de nossa ancestralidade, pensamentos, sonhos, crenças, tradições, costumes, enfim de nossa negritude. Temos sistematicamente convivido com percepções pejorativas que desconsideram tal matriz. No Brasil, existem exemplos dos efeitos paradoxais dessas considerações pejorativas acerca da negritude que se produz em meio à cultura afro-brasileira.
Isso inevitavelmente contribui para fortalecer o racismo, contribuindo decisivamente para tornar o processo de branqueamento uma saída para inúmeros afro-brasileiros em seu legitimo desejo de ascensão social e reconhecimento público. Um dos nossos maiores escritores e, influente homem público era afro-descendente. Entretanto, em seu atestado de óbito, é declarado como branco: Machado de Assis, no Brasil República com seu ideário higienista e seu propósito de branqueamento, foi transformado em branco para contemplar a cegueira de nossas elites nacionais.
Seu atestado de óbito, antes de mais nada, confirma o processo de branqueamento a que estamos expostos. Isso nos informa um ideário eugênico inscrito no ordenamento: “negro desapareça ou torne-se branco”. Injunção racista que nos remete ao impossível.
O processo que sofremos de “coisificação” no período escravocrata foi contraposto por nossas produções culturais e religiosas, que impulsionaram um permanente movimento de enfrentamento, entretanto; essa originalidade ancestral tem sido atravessada por leituras preconceituosas e pejorativas que tendem a uma dimensão hegemônica na contemporaneidade.
Esse movimento retoma às navegações que nos trouxeram, faz parte de nossa condição existencial de sermos viajantes e de termos a diáspora como elemento constitutivo de nossa negritude o que comporta inúmeros impasses.
Todavia, a presença africana no Brasil e no mundo, bem como, as múltiplas culturas e religiões implementam entre outras coisas, na contra mão da barbárie, o samba, a capoeira, o candomblé, o maracatu, a vida e os textos de Machado de Assis, entre outras coisas.
Atos dessa magnitude desenvolvem referências, que orientam nossas lutas contra o racismo e a desigualdade racial porque revelam que em tempo algum fomos bestialidades escravas. No mundo, nossa presença negra, também, produziu outras saídas singulares – nem por isso despolitizadas e inocentes – de enfrentar, corajosamente, o racismo com todo seu potencial exterminador inclusive de nossas culturas ancestrais e tradicionais. 
Enfrentar o terrorismo tem haver com isso porque ele comporta outras formas de marginalidade e coisificação como o racismo. Devemos urgentemente consultar Mandela que em sua luta contra o apartheid foi considerado terrorista. Seria, no mínimo, um diálogo interessante. Aliás, sua historicidade revela uma bela consideração acerca da coragem que não implica ausência de medo.
Todos nós estamos com medo, aterrorizados e me ocorre que a única saída é falarmos disso para encontrarmos um fundamento que não seja militar, bélico, mortal e relativo à guerra de todos contra todos. Nossa Política, como aponta Foucault, precisa superar esse paradigma terrorista da guerra de todos contra todos.  
Um pouco de psicanálise informa que demos – ao assassinar um assassino – um atestado de guerra mútua e sem fim. Parece-me que ratificamos o terrorismo como um fundamento que une o ocidente ao oriente em uma cruzada sem fim. Nesse ordenamento, caminhamos loucamente rumo a um precipício e isso não é prudente.

domingo, 2 de janeiro de 2011

O Dia que nos Tornamos Independente

Estou tendo grande dificuldade em escrever acho que estou envelhecendo e me encontro fora de minhas melhores condições. Entretanto, nada disso interessa mais que a realidade e seus incomensuráveis fatos. A realidade invade nossa existência e torna as coisas inteligíveis. Assim, podemos compreender a vida em seus inúmeros acontecimentos alguns mais felizes outros infelizes. A vida é assim, contudo, podemos viver melhor com esperança e trabalho.
Ontem dia 1º de janeiro ouvimos muitos discursos importantes e presenciamos um momento histórico relevante que envolve todos nós. Ontem, pela primeira vez nesse país, uma mulher assume a presidência do país após suceder um operário. Ontem, pela primeira vez, vimos um presidente sair do governo e ir até seu povo como se fossemos íntimos.
O novo presidente do país disse coisas fundamentais: realizar uma reforma tributaria, assumiu que os professores são a máxima autoridade na educação, que precisamos superar nossa histórica e péssima distribuição de renda e que temos que produzir desenvolvimento com preservação da natureza. Além disso, está colocado algo imprescindível à construção de um país democrático e justo: garantir nossa soberania, ou seja, o modo específico como nos pensamos e estabelecemos nossa governança, estabelecemos nosso lugar no mundo sem temer nossos pensamentos, sem nos submeter a tiranias e com autonomia para defender com justiça nossos interesses.
Muitas outras coisas foram feitas e ditas entre elas o compromisso de amor pelo Brasil e seu povo peculiar, alegre, feliz e extraordinariamente forte. O Brasil sempre foi um país importante para o mundo deste nossa brutal colonização e hoje ainda é objeto da cobiça alheia pelas suas incomensuráveis riquezas. Nosso povo movido pela sua boa fé sempre esteve por inúmeros acontecimentos mobilizados por más intenções. Intenções que esculpiram em nós autoritarismos, imperialismos, colonialismos e, por vezes, preconceitos e o sentimento de inferioridade.
Esse conjunto de coisas nos vez ver os outros como superiores a nós. Entre nós mesmo desenvolvemos esse curioso sentimento e nos separamos de nossos compatriotas mais vulneráveis às circunstancias nefastas que aprofundaram nossos quadros de miserabilidade, violência, racismo, e pobreza. Os recentes acontecimentos como o absurdo aumento de 62% dos salários de nossos parlamentares e a guerra interminável nos morros de nosso país, revelam esses horizontes desafiadores que temos pela frente e que comprometem nosso futuro e nossa responsabilidade com nós mesmos e com os outros.
Um país exige trabalho e discursos para formalizar os horizontes. Nossa condição humana exige que estejamos no mundo junto aos outros e nessa perspectiva, desenvolvemos nossa vida e politicamente nos constituímos como senhores de nosso destino e donos de nosso amanha. O Brasil inaugura com a força de sua gente e a grandeza de nossos ancestrais – índios e africanos – que nos forjaram nas fornalhas de nossas inúmeras histórias de terror e opressão, um novo tempo de luta pela igualdade, justiça e democracia.
Temos com a vitória de Dilma a inscrição de um novo paradigma para pensarmos o futuro e como queremos contribuir para um mundo melhor. Para mim, a vitória de Dilma não representa simplesmente a vitória de um partido, ou de uma mulher ou mesmo a continuidade de um governo com amplo apoio popular. Essa vitória que é de todos nós representa a possibilidade de retificarmos os antagonismos inaceitáveis que permeiam nossa vida politica e condenam nosso futuro ao passo em que, definem a iniquidade e a miséria de inúmeros brasileiros por suas origens populares. Somos um povo de origem negra e indígena e essa condição foi traduzida por nossas elites como uma prova de nossa absoluta e insuperável subordinação aos interesses que visam nos inferiorizar para facilitar o saque de nossas riquezas e determinar a miséria perpetua de nosso povo.
O Brasil já não deseja ser uma colônia, não admite mais ser um país importante para um mundo, cada vez mais colonialista onde as “grandes” potencias, que nos qualificam como atrasados e pertencentes aos terceiro mundo produzem guerras para garantir sua soberba.
A vitória que se formulou ontem, dentro de nossos ordenamentos jurídicos, pode representar o inicio de uma nova era de prosperidade e de proximidade do Poder Público com os interesses de nossa gente. Nosso povo elegeu um presidente com nossa fisionomia, com origens semelhantes às nossas e produziu um governo com apoio popular que realizou inúmeras mudanças importantes. Temos que participar da continuidade das coisas que foram semeadas.
Nossas elites participaram das mudanças necessárias à edificação de um país mais justo porque a grandeza de nosso povo e a presença de nossa iluminada ancestralidade guiara nossos passos rumo ao futuro. O país vai mudar porque essa é a principal mensagem que existe em nosso belo Hino Nacional, que como uma profecia de fé e esperança, proclamam um mundo novo.
Há tempos somos vistos como uma terra exótica, uma espécie de paraíso perdido na terra, um país do futuro, etc. Nunca fomos, em tempo algum, uma gente bruta, inferior ou medíocre por nossas origens culturais e raciais. Nossos filhos de nossa terra e haveremos de saber disso para além das considerações pejorativas que nos enganam e nos deixam confusos. Nosso trabalho é sustentar a noção que o poder emana de nós e por nós deve ser exercito.            

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Dissabores Amorosos

Quando lhe vejo assim com fúria e rancores;

Esquecida de meu amor, de seus rumores, dos monossílabos em noites quentes de corpo a corpo que pronunciamos, dos gritos e tudo mais.

Quando esqueces que trago incertezas, meus infortúnios da vida, dos meus pesos, rancores e dos silêncios que tenho que sustentar.

Quando tudo parece fim, tenho em mim as insurgências dos marimbondos lutando por comida;

Uma luta terrível e virulenta que destrona palácios.

A plebe não pode esperar pelo raiar dos dias e me conservo como um enfermo terminal;

Sou uma alma penada em busca de conciliação.

Como te querer se tens a ausência como atributo e a dúvida como condição para amar.

Vivo apesar de suas ausências, se grito e falo auto é que sou homem: não suporto outra condição.

Não tenho opção de fazer-me aquilo que não sou.

Meus ditames de vida conservam instantes de ódio e amor.

Há tempos aceitei essa condição e não me incomodo muito com minha faltas.

Dividir é algo doloroso quando se desconhece incompleto.

Falto em tudo, tudinho mesmo, sem fim e com começo desconhecido.

Estou entre aquilo e aquilo outro, meu desejo também é interrogação.

Quando de vejo com ódio de mim tenho assombros e calafrios;

Mantenho a calma, mas não posso e não sei como fazer.

Te vejo partindo, indo-se para onde, não sei?

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Estranhamento

O estranhamento roeu minha capa de veludo;
Meu escudo e minhas forças se desmaterializaram;
Tornei-me pó, terra batida, nada, possessão, diabo, anjo torto, caído, traído.
Deveras, eu, deveria saber das lastimas do amor,
Pensei inocentemente que se podia saber dos desejos das mulheres.
Mas, tudo era ilusão ou mentira, fantasia ou loucura, engano ou erro.
Não sei mais o que ocorreu e o que deixou de acontecer.
Encontro-me sepultado deitado em solo queimado como um esqueleto abandonado á séculos.
Entretanto, à revelia de minha moribunda condição estou vivo.
Reconheço que o desejo é inventividade, que em noites muito escuras, não se permite pronunciar.
Estou nesse momento, aguardando palavras e guardando silêncio.
Não sei mais o que fazer e nesses casos é preciso deixar a vida conduzir os destinos.
A vida é afogamento em canteiro de couve flor;
É preciso saciar as fomes e encantar o belo;
Deixar-se levar, voar em meio à ventania, pousar-se em um galho para esperar bom tempo.
Sou pássaro preto deixo acariciar minha cabeça;
Sou um pombo branco destes de levar noticias de nova era;
Sou menino e homem bravo, ternura e fúria, sol e chuva com raios e trovoes.  
Na casa de santo encontro-me homem – humanidade efêmera.
Sou menino grande no colo de Oxum que me ampara nos tempos em que o amor faz chuva forte.
No quarto de Oxum no terreiro de Xangô assentei uma oferenda de redenção para voar mais leve;
Pedi a ela que essa moça de minha vida possa ficar ou ir; um pouco de paz para meus dias de luta; um pouco de amorosidade e ternura.
Oxum, essa minha senhora, deu-me tudinho que pedi e sei que não há embaraço em meus caminhos;
Em meus caminhos planto a sola de meus pés e os rumos de minhas múltiplas vontades;
Eu sou guerreiro e tenho ao lado de mim meu orixá formoso,
Orixá que costuma pronunciar seu nome em voz alta para lembrar-me que não estou sozinho.
Estou afundado em minhas dúvidas sobre nós dois;
Mas, resiste fortemente em mim à fé de meus encantos.
Encantos que invento quando remeto meus olhos sobre você;
Entretanto, sendo encantado por nascença, deixo-me falar: tome cuidado;
Um negro como eu costuma voar sem medo e com audácia para poder encontrar outras veredas de ternura e amor.
Tenho cheiro de terra e madeira porque do solo de minhas saudades continuarei a viver.
Nunca tive dúvidas antes de dar ouvido às suas questões.
Casei-me com essas circunstancias e agora: o que resta a fazer?
Calar-me e guardar silencio, encostar meu corpo no teu, sussurrar coisas sensuais em seu ouvido.
Amor faz sofrer porque de outro modo não passa de mentira.
Malandramente vou sambar com suas exigências para encontrar nelas algo de valia;
Vou sorrir usando meu chapéu panamá e deixarei meu cheiro serpenteando no ar;
Desejo um pouco da irreverencia de Exu para cantar minhas magoas;
Para ser leal à minha condição de ser senhor de meus pés e responsável pelos meus passos vou ficar.
Sei que nunca ficarei sozinho!